A curiosidade matou o CuriousCat

 

...ou "A CURIOUS MATOU O CAT", pois não consegui escolher qual tirada era a mais legal.

Jets, eu sei. Eu sei que nossos encontros andam mais escassos que as não respostas de todas as DMs que recebo em meu Instagram pessoal e privado, em que eu absolutamente só sigo pessoas selecionadas, e que, ainda assim, demoro a retornar. Não estamos falando dos evangélicos da minha conta pública. Não, estamos falando de amigos que eu mataria e morreria. Doaria um rim. Mas responder em menos de 2 semanas? Não exijam tanto de mim. É que alguns hábitos nunca morrem. Demorar a aparecer e dar notícias é meu cigarro com cafézinho preto que acabou de ser passado. 

Mas sempre tem um retorno. Sempre tem a volta nada triunfal do "desculpa, esqueci", ou "jurava que tinha te respondido". Desculpa, esqueci que tinha um blog. Jurava que tinha postado mês passado. Foram tantos os posts que prometi pra Ana Luíza (@bukckybarnes) que eventualmente concluí que era melhor não fazer mais promessas. É melhor quando não esperam absolutamente nada de você, porque aí sim, só aí, você supera expectativas. 

Nesse meio tempo: mudei de estado. Estou casada. A própria Ana Luíza está noiva* - e eu deveria saber, já que o noivo dela veio falar comigo a respeito antes de pedir, como se eu fosse um pai em algum livro da Jane Austen, o que eu acho gracioso e, honestamente, verídico. Mudei de apartamento duas vezes, consegui um emprego, fui demitida, consegui outro emprego. Voltei a jogar Nintendo. Terminei de ler A Little Life. Coisas assim, que foram acontecendo enquanto eu esquecia de responder DM no Instagram. 

*veja, eu sou realmente muito ruim de manter contato. No caso de estar prestes a publicar algo que menciona o status civil de alguém, sempre se atualize.


O que eu nunca perdi tempo pra me atualizar e manifestar, no entanto, é o que une a nós todos como sociedade e indivíduos em comunidade: fofoca. 

É fascinante o quanto nós seres humanos somos movidos a falar da vida dos outros, a saber da vida dos outros. Se não isso, conversaríamos sobre o que? Entre conversar sobre o infinito não descoberto do Universo e quem brigou com fulano e pegou cicrano, a mesa do bar se fecha pra dizer que cicrano é, na verdade, casado. 

Desde que o mundo é mundo (essa expressão tem um carinho muito grande no meu coração, assim como a estação Paraíso da linha Azul do metrô), nossa troca genuína de afeição é fundamentada no que a gente conta um sobre o outro. Talvez por isso durante toda a evolução da Internet, aplicativos surgiam pra te instigar à uma exposição maior. Uma vulnerabilidade que uma conversa de bar não entrega com tanta liberdade. A honestidade é muito difícil olho no olho, mas olho na tela? Em anônimo? Fico pensando quantos milhões queridos nerds universitários fizeram pela simples ideia de fomentar uma plataforma em que as pessoas se expõem sem saber a quem. É perfeito. 

Eu não quero falar sobre minha primeira vez com minha colega de trabalho, mas eu absolutamentei farei isso respondendo uma pergunta anônima num site público em que não só uma, mas todos meus colegas de trabalho poderão ler. É a magia do escondido. Por isso tanta gente se pega em segredo - e que bom que o fazem, pois a gente tem mais sobre o que fofocar no sábado à noite. 

Quando o Formspring.me bombou na internet (eu realmente escrevi "bombou". Não vou apagar, pra que fique registrado que isso de fato aconteceu: eu virei uma millennial), eu era uma fake da Alice de Crepúsculo no Orkut. A quantidade de horas em que eu passei conectada num modem da Claro lendo sobre como a Bell𝒶 Sw𝒶n tinha brigado com a 𝐵𝑒𝓁𝓁𝒶 𝒞𝓊𝓁𝓁𝑒𝓃, que era casada com o 𝙴𝚍𝚠𝚊𝚛𝚍 𝙲𝚞𝚕𝚕𝚎𝚗, alterou a química do meu cérebro permanentemente. Eram centenas de pessoas interessas em mandar uma pergunta em anônimo pra saber mais sobre um drama que definitivamente não era tudo isso, e eu nem conhecia essas pessoas, mas o 𝙴𝚍𝚠𝚊𝚛𝚍 𝙲𝚞𝚕𝚕𝚎𝚗 me mandou um scrap uma vez e eu me senti no direito de saber tudo sobre a vida dele e suas ex. 

Sempre me perguntei, no entanto, se eram centenas de pessoas mesmo, ou se a 𝐵𝑒𝓁𝓁𝒶 𝒞𝓊𝓁𝓁𝑒𝓃 mandava mensagens em anônimo pra ela mesma - o que seria algo que a 𝐵𝑒𝓁𝓁𝒶 𝒞𝓊𝓁𝓁𝑒𝓃 faria, let me tell you. Ninguém teria tantos seguidores anônimos antes mesmo do surgimento da profissão influencer na Internet. Estamos falando de 2008. 

Quando o Orkut mudou pro Orkut Beta, que você só conseguia logar com um convite e a estética automaticamente não nos satisfazia mais (nem mesmo com a promessa de mais dramas da família Cullen fake), o Mark Zuckerberg já tinha seu plano de controle mental das massas, e o Facebook apareceu. O Facebook foi a primeira rede social que eu tive com minha cara e nome, o que, por um lado, é triste, pois baixa auto estima desde pequena. Mas também é bom, porque eu era casada no fake, e se ficasse explicitado que eu era uma criança de 12 anos, meu casamento ficaria estranho, pra dizer o mínimo. 

O Formspring começou a morrer com a ascensão da nova Suprema, o Facebook. Talvez por isso, ou talvez pelo fato de que o Tumblr também começava a aparecer, e o Tumblr já inovava nesse ponto: não era preciso criar uma conta por fora pra receber suas mensagens anônimas: você já tinha isso integrado ao seu perfil, automaticamente. Ah, a vida que eu vivi com meu blog sobre River Song em Doctor Who no Tumblr. O prestígio de logar e ter desconhecidos do mundo todo te elogiando. Acho que por isso plataformas de perguntas anônimas fazem tão sucesso por um tempo. Todo mundo quer ser o artista C List que abre caixa de perguntas. Todos temos um pouco de Rodrigo Apresentador dentro de nós. 

Mas, verdade seja dita, a ferramenta ask do Tumblr envelheceu como um bom vinho do Porto. 


Mas o Facebook sempre foi o Facebook - a periferia da Internet. Sempre deu indícios pra sabermos que ele chegaria onde hoje está: na casa da sua avó bolsonarista. Então, é seguro dizer que o público do Facebook não chegava tão próximo do público do Tumblr. Mas todo mundo fofoca, e todo mundo quer saber se você está namorando ou ficando com alguém, quer seja um fã de Sherlock no Tumblr, quer seja o filho do pastor da igreja da sua mãe (é muito específico por um motivo). Assim, o Facebook teve que descobrir sua própria plataforma subcelebridade de perguntas anônimas: o ask. 

[Se for pra rankear as plataformas, o ask.fm é o mais direto ao ponto. Você suspeitaria que o site Formspring é sobre perguntas anônimas? Não, mas o ask.fm sim.]

Por ser a plataforma dos usuários do Facebook, essa segue sendo imemorável. Exceto, é claro, o primeiro anônimo de verdade, num perfil pessoal meu, que recebi na vida. Era um domingo à tarde e alguém que eu não fazia ideia de quem era me enviou uma mini crítica, alegando que "eu era bonita, mas devia fazer a sobrancelha, porque era muito grossa". 

Eu me senti uma estrela

Meus amigos responderam criticando este pequeno ícone anônimo, me mandando forças! Tá brincando? Eu fiquei LISONJEADA de receber meu primeiro anônimo ácido. Foda-se os "te acho incrível" ou "queria ser sua amiga"; nós, pessoas que nascemos pra ser subcelebridades, almejamos os "você é abusiva falsa feia e fedorenta". É um combustível que alimenta. 


O CuriousCat chegou nessa premissa. Bom, foi a plataforma anexa de perguntas anônimas escolhido pelo Twitter, então o que você esperava? O discurso de ódio já é liberado quando se tem nome e sobrenome. Podendo manter anonimato? Era a melhor das plataformas já criada. 

[Isso e, é claro, o fato de remeter a gatinhos. CuriousCat é o mais genial dos nomes e eu morrerei com esta opinião, mesmo que no futuro alguém faça um com cachorros pugs. Eu deveria fazer esse.]

Eu não sou uma subcelebridade Valéria Almeida como gostaria, mas minhas amigas sempre dizem que eu seria a subsubsub celebridade da internet dentre todas elas. Uma vez minha inimiga pessoal também tuitou que eu só tinha voz no Twitter, o que eu levei como um elogio. Isso e meu inevitável dom de entrar em discussão e confusão me fizeram uma figura propícia a ter um CuriousCat animado, pra dizer o mínimo. Não é como se eu fosse uma laurinha lero ou uma Não Inviabilze: nunca cheguei no patamar 𝐵𝑒𝓁𝓁𝒶 𝒞𝓊𝓁𝓁𝑒𝓃 de centenas de mensagens diárias. Mas eu tenho história pra contar. 

Surpresa, você está no Arquivo Confidencial: CuriousCat andpeggs

Hoje acordei pensando no querido e finado CuriousCat. Quando a timeline era cheia de janelinhas de resposta, e você ignorava todas, até ver uma que era xingamento e direitos humanos ofendidos, e você tinha que clicar nessa, porque essa sim interessava. Plataformas de perguntas anônimas não são pra amor: isso era papel dos depoimentos do Orkut. A gente precisa usar do anonimato pro que importa: ofender quem a gente não gosta e descobrir fofocas que não teríamos coragem de perguntar mostrando a cara. 

Entrei lá, porque é óbvio que entrei, e nosso querido gato encontra-se prestes a ser eutanasiado. Como antes de qualquer morte iminente, tomei a liberdade de relembrar nossos melhores momentos juntos, num supercut das cenas mais bonitas do filme de alguns anos que passamos juntos. 

Foram mil e cem respostas, e não sei até onde aguento abrir essa caixa com tantas memórias, mas darei o meu melhor. 

1 - Quando me mandaram um hate pela última vez


Eu nunca serei a pessoa que responde "e você que se esconde por trás de um anônimo pra mandar hate pros outros", porque isso é cringe. Eu aprecio a atenção e trabalho do anonimato e a coragem de apertar o botão enviar, correndo o risco de esquecer de apertar o "enviar em anônimo". Eu aprecio você. 

Mas, nesse caso em específico, eu queria muito saber quem foi. Pra dar um abraço e um obrigada. Veja: o ponto alto de receber hate anônimo na internet é que você se sente importante o suficiente por estar afetando os pensamentos de alguém de tal forma que é inevitável pra ela ter de se manifestar quanto a isso. 

Eu gosto do tom desse. "Você é meio tóxica né?". Eu gosto muito do tom desse. É uma crítica? É apenas uma reflexão? É no tom de "morra, puta" ou no tom que a Rafa Kalimann falou "a Anitta não veio, né?" no BBB20? Eu genuimente gosto muito desse. 

Foi o último que recebi. Para sempre em meu coração. 8/10.

2 - Desempregada e tem dinheiro? 


Eu amo a entonação "se você é da África, por que você é branca?". 

Não acho que essa querida quis mandar isso como uma crítica, mas eu acho que teve uma crítica, mesmo velada, mesmo sem querer. A metalinguagem do anonimato é sensacional. 7/10

3 - Deni & The Jets furou a fila da vacina


Eu gosto MUITO desse. Esse entrega tudo. Não é só sobre a crítica, ou o hate, ou não gostar de mim. Esse tem até o "te admiro muito", que é pra não confundir com os demais. Mas ele tem plot. Tem contexto histórico e político, tem acusação. É como se fosse um documentário da Petra Costa pro Globoplay. 10/10

Nada mais subcelebridade do que ser cancelada na internet, e nesse dia eu fui. 

Quase dois anos depois eu venho me manifestar sobre tais boatos e confessar que, infelizmente, eu não furei fila pra tomar vacina - mas teria sido ótimo pra minha carreira de ex BBB se eu tivesse. 


4 - A máfia dos Cactos


Tenho um carinho muito grande por esse. Receber hate por não gostarem de você é completamente aceitável e compreensivo, mas receber hate pela Juliette do BBB21 é um pouco demais, até pra mim. 5/10

Só não é melhor do que esse aqui: 


FALA DA JU MAS É IGUAL, SEMPRE TEM QUE SER O CENTRO DE TUDO.

Nem o mais experiente dos roteiristas do SNL conseguiria fazer um comentário tão engraçado quanto esse. Fala mal da Ju mas é igual a ela!!! Esse é comédia na sua forma mais pura, explicar porque é tão engraçado estragaria a experiência do ouvinte. 10/10 pela contrução cômica. 

5 - Deni & The Jets beija homens? 


Esse é um clássico, e não dá pra errar com clássicos. 

Do Formspring ao CuriousCat, sempre terá os fiscais de relacionamento, os que perguntam mensalmente se você ainda namora, e os que se declaram apenas quando você está namorado. Deus abençoe o coração desse querido. Desejo tudo de melhor pra ele. Mas fui solteira por 22 anos. Onde você estava? 

Mas não dá pra pedir muito. Ele descobriu que eu beijava mulhares em abril de 2021. Definitivamente leitura de ambiente não é seu forte. 

Às vezes gosto de fanficar que ele continua me esperado, sem que eu saiba sua verdadeira identidade. Nosso conto de fadas que não existiu nessa realidade, mas talvez em outra. 

O clichê do anônimo apaixonado pro você veio pra mim duas vezes: nessa, e quando eu de fato namorei uma anônima do CuriousCat. 

Como eu disse, é um clássico. 9/10

5.1 - Vai terminar quando?


Essas vieram antes, e eu não acho que tenha sido da mesma pessoa, mas continuam sendo boas. 8/10 pelo buzz no assunto que me dá relevância, como uma Taylor Swift da minha geração. 

6 - 


Eu nem tenho o que falar desse aqui. Coesão, clareza e vai direto ao ponto. 10/10

7 - Inseguranças expostas


Jets, eu não vou mentir. Essa aqui foi a que mais me pegou na época. Questão de terapia e tudo. Cinco palavras que alugaram um triplex na minha cabeça, porque de fato eu sempre achei que tudo sobre mim era exaustivo. Um anônimo não deveria ter o poder de entrar dentro da minha cabeça e me fazer de refém. 

Mas aí que reside a linha tênue da experiência subcelebridade de plataformas anônimas. All fun and games até alguém fazer piada com sua insegurança. Mas é necessário. Atribui fundamento e enredo na trama. Por conta disso, 6/10. 



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Reviver anos e anos de exposição da minha própria vida me deixou um pouco zonza. Encontrei todo o destrinchar de quando me apaixonei por minha esposa, encontrei anônimos assinados com o emoji que minha ex usava pra se identificar. É uma vida exposta em pequenas caixas de respostas, e eu espero que o site não caia nunca, pra que meus netos possam ver o quanto a avó deles era legal e A Mais Odiada Da Internet (cara, a gente não te conhece). 

Mas também, de alguma forma, fui a mais amada. O tanto de carinho e amor que esbarrei nessa minha pesquisa de campo. Tantas pessoas que sequer sei o nome, ou como me conheceram, me falando as coisas mais bonitas, sem nem se identificarem. Isso é legal. Pra além do sentimento de se sentir como uma celebridade - falo sério. É legal demais saber que minhas palavras e minha mente alcançaram pessoas que eu nem esperava. 

Eu acho que as plataformas de perguntas anônimas nunca vão desaparecer. O CuriousCat morreu por ora, mas é só questão de tempo até que a próxima apareça, e a gente lembre o quão legal é averiguar a vida dos outros sem se comprometer. Pro próximo site de perguntas anônimas, eu quero o comprometimento de um Perez Hilton, TMZ e Hugo Gloss, todos juntos, pra tentar adivinhar se eu sonego impostos ou não. 

E se aparecer outra pessoa dizendo que sempre foi apaixonada por mim e descobrindo hoje que eu namoro, eu juro por Deus.